Quem escreve dicionários hoje em dia?

Quem escreve dicionários hoje em dia?Reprodução Pixabay

A construção e a atualização de dicionários continuam sendo tarefas fundamentais para a preservação e desenvolvimento da linguagem.

Embora a tecnologia tenha transformado profundamente esse processo, a atuação dos lexicógrafos (pessoas que escrevem dicionários) segue sendo essencial.

Quase cinco milênios de histórias 

O primeiro dicionário que se tem registro surgiu na Mesopotâmia (atualmente territórios de Iraque e Síria), em meados de 2.600 a.C, quando os habitantes daquela região gravavam em pedras as palavras que mais chamavam a atenção.

Hoje, todas as culturas possuem o seu próprio livro com o vocabulário de suas línguas e, consequentemente, profissionais dedicados à lexicografia.

Exemplo do primeiro dicionárioReprodução Pinterest publik.me

E há uma grande quantidade deles em todo o mundo, como afirmou Mauro de Salles Villar, diretor do Instituto Antônio Houaiss, em entrevista ao Portal iG.

“É uma atividade que continua muito importante para o desenvolvimento das obras de referência que eles fazem e também para o desenvolvimento da computação, que usa as línguas para se comunicar e precisa entendê-las na maior profundidade possível”, explica.

Para trabalhar com lexicografia, é essencial estudar Linguística ou Letras, com foco em Lexicologia e Lexicografia. Cursos específicos na área ajudam, mas experiência com análise de palavras, dicionários e linguagem também é fundamental.

O impacto da tecnologia na produção de dicionários

A evolução da inteligência artificial e da internet modificou significativamente a maneira como os dicionários são elaborados e atualizados.

Para Villar, essa mudança algo inevitável: “Todos os processos se alteraram com a entrada da computação e da internet. A lexicografia usa essas ferramentas exponencialmente, como parece óbvio.”

A digitalização e o uso de bancos de dados dinâmicos permitem que a inclusão de novas palavras seja feita de maneira muito mais ágil e precisa.

Digitalização e banco de dados ajudam na atualização dos dicionáriosReprodução Freepik

Diferentes fontes, como jornais, publicações científicas e registros do uso cotidiano da língua, são analisadas automaticamente, fornecendo uma base ampla para a incorporação de novos termos.

Como novas palavras entram nos dicionários?

O processo de seleção de novos vocábulos é criterioso. Villar explica que as palavras são incluídas com base em seu uso e relevância na sociedade.

“Elas entram nos dicionários pelo seu percentual de uso ou por fazerem parte das literaturas, ciências e tecnologias atuais e do passado. Palavras terminológicas ou de determinada ciência precisam de uso entre os não especialistas de sua área (por exemplo, serem usadas em jornais e revistas) para entrarem nos dicionários.”

O volume de palavras existentes na língua é imenso, chegando a milhões. Segundo o especialista, apenas a medicina possui mais de 500 mil termos, enquanto a química ultrapassa os 2 milhões.

Assim, a decisão de quais palavras incluir em cada edição se torna um processo de seleção cuidadoso. “O que se faz em lexicografia é uma escolha do que vai ficar de fora, porque o material é imenso e não abarcável numa única obra.”

Palavras entram ou não nos dicionários de acordo com seu percentual de usoReprodução Freepik

A frequência das atualizações

Diferentemente do que se pode imaginar, a atualização dos dicionários não ocorre apenas de tempos em tempos.

Villar destaca que, pelo menos no caso do Dicionário Houaiss, que ele participa ativamente na atualização, o processo é contínuo.

“A base de dados do Dicionário Houaiss por exemplo, é atualizada, acrescentada, datada e tem verbetes reformulados diariamente, inclusive nos sábados, domingos e feriados. O trabalho é praticamente ininterrupto. Os dicionários que não se atualizam e se corrigem fenecem, como qualquer ser vivo que não é alimentado.”

Essa necessidade constante de atualização reforça a importância da lexicografia no mundo moderno, acompanhando a rápida evolução do vocabulário em diferentes áreas do conhecimento.

Palavras entram ou não nos dicionários de acordo com seu percentual de usoReprodução Freepik

Impressos versus digitais

O mercado de dicionários também passou por uma grande transformação com o avanço das plataformas digitais.

Villar aponta que os exemplares impressos ainda têm um público específico, mas a predominância do meio digital é inegável.

“Os dicionários impressos têm venda para fins especialmente escolares. Todos os grandes dicionários e enciclopédias pelo mundo, com poucas exceções, trabalham hoje usando a internet como suporte, por ser um meio teoricamente sem limites, diferente do meio dos livros físicos, onde o espaço importava muito, assim como a extensão da obra.”

A flexibilidade proporcionada pelos formatos digitais permite não apenas a inclusão contínua de novos termos, mas também a possibilidade de acesso facilitado por usuários em qualquer lugar do mundo.

O mundo digital ajuda bastante na inserção d enovos termos nos dicionáriosReprodução Freepik

O maior desafio da lexicografia contemporânea

Manter um dicionário atualizado e relevante sempre foi um desafio, e essa dificuldade persiste até hoje. Segundo Villar, o principal trabalho continua sendo o mesmo:

“Atenção ao que aparece e não está dicionarizado, pesquisa etimológica de peso para determinar ou aproximar da verdade a origem e a história de cada nova palavra, registrar a data em que se encontra mais pregressa do uso dessa palavra em documento escrito, etc.”

Com a rapidez das mudanças linguísticas, a tarefa dos lexicógrafos se tornou ainda mais dinâmica. O compromisso de acompanhar essa evolução garante que os dicionários continuem sendo referências confiáveis para o estudo e o uso da língua.

A lexicografia segue como uma atividade fundamental, tanto para a comunicação humana quanto para o avanço da tecnologia.

Apesar das transformações no processo e na forma de distribuição dos dicionários, a necessidade de profissionais atentos às mudanças linguísticas permanece essencial.

O trabalho diário de atualização e seleção de termos assegura que essas obras continuem cumprindo seu papel de registrar e organizar a língua de forma eficiente e acessível.

 

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