Após denúncias de ameaças, MPF recomenda mudanças em obras de estrada que liga cidades do Acre


MPF-AC encaminhou recomendação ao Imac, Deracre e à Prefeitura de Porto Walter. Obras no Ramal do Barbary, que deve ligar a cidade isolada de Porto Walter a Cruzeiro do Sul, é alvo de ação do MPF-AC por irregularidades. Ramal Barbary, em Porto Walter, no interior do Acre, é alvo de ação do MPF-AC
Arquivo pessoal
Após líderes indígenas denunciarem ameaças em razão da determinação judicial que bloqueou o chamado “Ramal do Barbary”, que liga a cidade de Rodrigues Alves a Porto Walter, ambas no interior do Acre, o Ministério Público Federal (MPF) recomendou medidas para que as obras respeitem as legislações ambiental e indígena durante o processo de licenciamento.
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A recomendação é direcionada o município de Porto Walter, ao Departamento de Estradas de Rodagens do Acre (Deracre) e ao Instituto do Meio Ambiente do Acre (Imac) para que os processos de consulta e licenciamento ambiental sejam refeitos integralmente e as reivindicações dos indígenas sejam atendidas. (Veja os posicionamento dos órgãos mais abaixo)
A Justiça Federal da 1ª Região é favorável um recurso do MPF-AC e determinou o bloqueio de um trecho do Ramal Barbary e a proibição de intervenções no local em dezembro de 2023.
Esse recurso foi apresentado no âmbito de uma ação civil pública movida pelo MPF-AC questionando a abertura da passagem e os impactos que podem ser causados na Terra Indígena (TI) Jaminawa do Igarapé Preto. O órgão federal também argumentou que não houve consulta aos indígenas que moram na região.
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O órgão apontou na ação que a licença ambiental concedida para a obra não poderia ser emitida pelo Instituto de Meio Ambiente do Acre (Imac), mas pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), com a anuência da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) e do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).
Em visita à Terra Indígena Jaminawa do Igarapé Preto entre 25 de fevereiro e 1º de março, as equipes do MPF-AC foram informadas de que moradores do entorno e de municípios vizinhos atribuíam aos indígenas a culpa pelo fechamento do ramal, o que gerou, conforme o MPF “hostilidades e ofensas, algumas delas de cunho racista, veiculadas pessoalmente e pelos meios de comunicação”.
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Recomendação
Nessa quinta-feira (27), o MPF-AC divulgou que a recomendação ‘detalha as diretrizes que devem ser seguidas caso o Estado do Acre e os municípios envolvidos queiram prosseguir com a obra’.
Dentre as medidas recomendadas estão:
Necessidade de dois processos de consulta: um sobre a própria decisão de construir o ramal e outro referente à emissão das licenças ambientais pelo Imac;
Essa consulta deve ser livre, prévia, informada e culturalmente adequada, desde as primeiras etapas de planejamento;
Vedada qualquer forma de intimidação, ameaça, assédio ou cooptação, bem como a apresentação da obra como fato consumado;
Solicitem à Funai a emissão do termo de referência para o Estudo do Componente Indígena (ECI), que se distingue da consulta livre, prévia e informada;
Licenciamento deverá seguir o rito do EIA/RIMA, e caso o ramal afete unidade de conservação ou sua zona de amortecimento, como o Parque Nacional da Serra do Divisor, será necessária a autorização do ICMBio;
Empreendedor também deverá apoiar a implementação e manutenção de unidade de conservação como forma de compensação ambiental;
Pré-consulta com a participação da Funai, da Organização dos Povos Indígenas do Rio Juruá (OPIRJ) e da Comissão Pró-Indígenas do Acre (CPI-Acre) para definir a forma como a comunidade deseja ser consultada;
Os órgãos têm 15 dias para informar se acatam ou não. “O não acatamento poderá implicar a adoção de medidas judiciais cabíveis”, orienta o MPF-AC.
O que diz os citados
O Deracre informou que recebeu a recomendação e está em tratativas;
Já o Imac respondeu à reportagem que “recebeu a recomendação do Ministério Público Federal (MPF) e está analisando e dando encaminhamentos para atender às demandas que são de responsabilidade a esta autarquia”;
O g1 aguarda retorno da Prefeitura de Porto Walter.
Reivindicação
A Prefeitura de Porto Walter reuniu, em junho de 2023, autoridades municipais e políticos para discutir o acesso terrestre entre o município, um dos mais isolados do estado, a Cruzeiro do Sul.
Em 2022, uma estrada de terra foi aberta com cerca de 84 km de extensão, mas acabou sendo interrompida porque atravessaria um trecho da Terra Indígena Jaminawa do Igarapé Preto.
Acesso faz ligação entre Porto Walter e Cruzeiro do Sul
Asscom/Prefeitura
Com a interrupção, a gestão municipal à época buscou um trajeto alternativo, e afirmou que durante a audiência foi definido que o Deracre iria iniciar estudos para garantir um trajeto que desviasse do território.
Antes do acesso ser aberto em 2022, era preciso cruzar o Rio Juruá, em uma viagem que dura de três a cinco horas, para chegar ao município. Em caso de barcos e balsas transportando mercadorias, o percurso pode levar até dois dias, dependendo do nível d’água. A construção havia reduzido esse tempo para quatro horas e meia.
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Debate
Em agosto de 2024, autoridades e órgãos ambientais do Acre se reuniram em uma audiência pública na Assembleia Legislativa do Acre (Aleac) para discutir a viabilização do estudo de impactos ambientais na construção da estrada entre Porto Walter e Cruzeiro do Sul, ambos no interior do Acre.
A audiência contou com a presença de autoridades como a vice-governadora Mailza Assis, a representante do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Melissa de Oliveira Machado, o procurador do Ministério Público Federal (MPF-AC), Lucas Costa Almeida Dias, o prefeito de Rodrigues Alves, Jailson Amorim, dentre outros.
Segundo a superintendente do Ibama, o instituto recebeu a constatação, foi elaborado um relatório onde foi confirmada uma extensão de 12 quilômetros de intervenção da estrada na terra indígena.
Em setembro do mesmo ano, a Justiça Federal do Acre pediu que o governo do estado, representado pelo Deracre e Imac, comprovasse o bloqueio do Ramal Barbary. Na reunião, a magistrada Raffaela Cássia de Sousa intimou os órgãos a comprovarem o bloqueio do trecho, se ainda havia passagem de veículos e quem estava fazendo a fiscalização.
Ainda no encontro, segundo consta no documento, os órgãos estaduais informaram que uma cerca e uma porteira foram instalados no local e que também foi feito um relatório ambiental simplificado. A juíza deu o prazo de cinco dias para que essa documentação fosse encaminhada.
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Após líderes indígenas denunciarem f ameaças em razão da determinação judicial
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