Pedido da Starlink ao STF para suspender bloqueio das contas da empresa é rejeitado pelo relator do caso na Corte, ministro Zanin

Juristas discordam da decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo, de bloquear contas da Starlink, de Elon Musk, para garantir o pagamento de multas aplicadas ao X. STF nega recurso e mantém contas da Starlink bloqueadas
Juristas manifestaram discordância da decisão do ministro Alexandre de Moraes de bloquear contas de outra empresa de Elon Musk. O pedido da Starlink ao STF para suspender o bloqueio foi rejeitado na noite desta sexta-feira (30) pelo relator do caso na Corte, ministro Cristiano Zanin.
No despacho de quinta-feira (29) que determinou o bloqueio das contas da Starlink, o ministro Alexandre de Moraes afirma que a medida serve para garantir o pagamento de R$ 18,35 milhões em multas aplicadas até agora ao X. As duas empresas são do bilionário Elon Musk. O ministro aplicou as multas porque o X não cumpriu a determinação do STF para suspender contas de investigados no inquérito das chamadas milícias digitais.
O ministro citou decisões anteriores do Superior Tribunal de Justiça no mesmo sentido, além do artigo 50 do Código Civil, que trata do assunto. Alexandre de Moraes afirmou também que:
“X Brasil, Starlink Brazil Holding Ltda e Starlink Brazil Serviços de Internet constituem, em território nacional, juntamente com a SpaceX, o que em nosso ordenamento jurídico se denomina ‘grupo econômico de fato’, pois, embora sem um ajuste formal expresso, e mesmo sendo sociedades empresárias autônomas e distintas entre si, atuam sob a mesma coordenação e comando de Elon Musk e com objetivos absolutamente convergentes”.
Nesta sexta-feira (30), no recurso ao STF, a Starlink argumentou que “o bloqueio de ativos financeiros viola garantia constitucional, uma vez que inexiste dispositivo legal que autorize o bloqueio de propriedade privada de quem não é parte nos autos, sem que antes lhe seja assegurado o devido processo legal e todas as garantias necessárias à sua defesa”.
Mais adiante, a empresa afirmou que “a não observação do procedimento legal lhe impediu de exercer o seu direito à ampla defesa e à garantia ao devido processo legal e ocasionou o bloqueio de todos os bens. Por essa razão, é imperiosa a anulação do ato coator”.
O relator do recurso é o ministro Cristiano Zanin.
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O diretor executivo do InternetLab, Francisco Cruz, afirmou que a decisão do ministro Alexandre de Moraes em bloquear as contas da Starlink seria justificada se ela fosse uma empresa de fachada do X ou tivesse as mesmas finalidades.
“Realmente é um debate polêmico porque o direito societário, vamos dizer assim, não deixa que você responsabilize uma empresa pelos atos da outra, a não ser que tenham mais elementos que, por exemplo, apontem para uma fraude, algo como uma empresa ser fachada da outra, e etc. Porque, como eu estava dizendo no começo, a gente tem os direitos, por exemplo, dos donos da SpaceX que não são donos do X em jogo também. Essas contas não são só do Elon Musk. Elas são da empresa”, diz Francisco Cruz.
O advogado especializado em Direito Público, Clóvis Bertolini, considerou o bloqueio feito por Moraes incomum. Ele afirmou que, de acordo com a legislação brasileira, deveria ser comprovada uma fraude envolvendo as duas empresas para que uma pudesse responder pela outra.
“A legislação brasileira coloca a necessidade de uma coordenação entre as empresas. Essa coordenação não é pelo fato de ter o mesmo acionista, não é pelo fato de ter a mesma vinculação. Isso não é simples. É preciso que se comprove uma direção única com intuito fraudatório, ou seja, que aquilo que a gente está tentando responsabilizar a empresa não se consegue por conta da sua estrutura jurídica. Quando o ministro Alexandre de Moraes utiliza ‘grupo econômico de fato’, na visão dele, seria a coordenação por parte do mesmo acionista majoritário, que seria o senhor Elon Musk. Mas quando a gente vai fazer a decupagem, ou vai fazer a análise de cada uma dessas empresas, percebe-se que a estrutura dessas empresas é totalmente distinta”, afirma Clóvis Bertolini.
O advogado e fundador do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro, Ronaldo Lemos, considerou correto o recurso da Starlink.
“A pergunta que a gente tem que fazer é: essas conexões são suficientes para configurar grupo econômico? E se isso ficar configurado, até faria algum sentido esse tipo de ação. Então, a análise tem que ser cuidadosa e tem que ser profunda. Então, esse ponto é importante. E a Starlink, como empresa independente, separada do X, seguiu o caminho correto, entrou com um mandado de segurança”, afirma Ronaldo Lemos.
Em entrevista à GloboNews, o advogado Luiz Augusto D’Urso afirmou que a decisão de Moraes afeta duas empresas independentes.
“Essa decisão, especificamente, juridicamente me incomoda. Ela simplesmente mistura duas empresas que são totalmente independentes. Acredito que essa decisão especificamente de bloquear o dinheiro da Starlink para eventualmente pagar multas processuais por descumprimento da X seria uma confusão jurídica e poderia, sim, em razão do recurso, ser derrubada. Isso seria adequadamente reconhecido pelo Supremo, porque são situações totalmente distintas, empresas que estão em ramos totalmente distintos, não tem confusão jurídica. Cada uma tem sua personalidade jurídica, cada uma tem sua atividade. Então, por causa disso, eu entendo que essa decisão pode ser equivocada e me incomoda bastante”, diz Luiz Augusto D’Urso, advogado especialista em Direito Digital e professor da FGV.
Atualização
Na noite desta sexta-feira (30), o ministro do STF Cristiano Zanin rejeitou o recurso da Starlink. Na decisão, Zanin afirmou que a empresa deveria ter usado outro tipo de recurso, e que não considerou um abuso a decisão de Moraes.
Zanin afirmou ainda que o bloqueio das contas não tem o objetivo de cobrar multa e, sim, de inibir um comportamento afrontoso contra a mais alta Corte do país, e que o reiterado descumprimento de decisões do Supremo é extremamente grave.
A rede X ainda continua. A suspensão não é instantânea; depende da ordem do STF – Supremo Tribunal Federal chegar até a ponta do processo, chegar até as operadoras de telecomunicações.
A Anatel, a Agência Nacional de Telecomunicações, que já foi notificada sobre a decisão, informou que está tomando as providências necessárias. O presidente da Anatel, Carlos Manuel Baigorri, disse que são mais de 20 mil operadoras de telecomunicações em todo o país e cada uma delas tem uma maneira de cumprir essa suspensão.
“Há uma complexidade. Cada empresa, dependendo do seu tamanho, da sua arquitetura, tem uma forma diferente de fazer esse bloqueio. Após isso, nós solicitamos que essas empresas nos comuniquem se fizeram ou não fizeram o bloqueio. E também, nas grandes empresas, nós vamos verificar, fazer atividade de fiscalização, para verificar se a decisão foi efetivamente cumprida”, afirma Carlos Baigorri.
Na noite desta sexta-feira (30), o ministro Alexandre de Moraes retirou o prazo de cinco dias para que as empresas Apple e Google retirassem a rede social X das lojas de aplicativos. O Google informou que não vai se pronunciar sobre o assunto. A Apple não retornou ao contato do Jornal Nacional.
A decisão também suspende o trecho que proibia as lojas virtuais de comercializarem aplicativos de VPN, que permitem o acesso a sites restritos por meio de endereços de outros países. Nesse novo despacho, o ministro disse que a decisão vale até que sejam feitas novas manifestações no processo, evitando eventual prejuízo as todas as empresas. Mas o ministro manteve a multa diária de R$ 50 mil para quem tentar acessar o site do X por meio de ferramentas VPN.
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