“Colapso da proteção às crianças”, diz especialista sobre violência

O Atlas da Violência 2025, divulgado nesta semana, pelo Ipea e o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, mostra uma intensificação da violência contra crianças na chamada primeira infância.

O número de homicídios contra crianças de 0 a 4 anos de idade cresceu 15,6% em um ano, a maior alta de toda a série histórica. Na maior parte dos casos, o crime foi cometido com arma de fogo.

No período de 2013 a 2023, foram assassinadas 2.124 crianças nesta faixa etária. Embora o número seja menor do que as mortes de crianças entre 5 e 14 anos (6.480), e de adolescentes entre 15 e 19 anos (90.399), esses homicídios representam uma tendência preocupante. Essa é a avaliação de Mariana Luz, CEO da Fundação Maria Cecília Souto Vidigal, organização que trabalha com a primeira infância.

“Estamos diante de um colapso da proteção mais básica que uma sociedade deve garantir: a vida de suas crianças”, afirma Mariana. Ela chama a atenção para uma tendência de alta em diversos índices. “Todos os tipos aumentaram: negligência, violência sexual, violência física. Essa estatística expõe uma realidade brutal. Até as crianças mais novas, que deveriam estar em ambientes de maior proteção e cuidado, estão sendo vítimas de violência”, completa.

Os dados do Atlas revelam um aumento de 383,4% nos episódios de violência sexual, 338,8% nos casos de negligência e de 195,7% nos casos de violência física.

Violência no ambiente doméstico

Diferentemente de outras faixas etárias, a violência que atinge crianças dessa idade é cometida, sobretudo, dentro de casa. A cada dez casos, sete ocorrem no ambiente doméstico. Em quase 80%, as violações são cometidas por familiares.

“Essas violências não acontecem por acaso. Elas estão inseridas em contextos de desigualdade social profunda, onde famílias vivem em situações de vulnerabilidade extrema, com moradias precárias, acesso limitado à educação, saúde e proteção social. A ausência de políticas públicas universais e integradas intensifica esse risco”, avalia Mariana.

Episódios de violência nesta faixa etária têm um impacto duradouro. “A insegurança e a exposição à violência durante a primeira infância podem afetar desde saúde, sociabilização, autoestima, memória, capacidade de aprendizagem e atraso de desenvolvimento em geral”. Segundo Mariana, a violência também pode gerar na criança o chamado estresse tóxico, que compromete o desenvolvimento infantil em vários níveis, além de favorecer a repetição de violência nas gerações seguintes.

Soluções e políticas públicas

A CEO da Fundação Maria Cecília Souto Vidigal também integra o Comitê Intersetorial de Primeira Infância, que irá conduzir a implementação da Política Nacional Integrada de Primeira Infância, cuja criação foi autorizada pelo governo federal em junho do ano passado.

Para ela, reverter o aumento dessa violência exige ações coordenadas e integradas. “Isso significa tratar a questão não como episódios isolados, mas como resultado de desigualdades sociais profundas e da ausência de políticas públicas integradas”, afirma.

“Garantir os direitos das crianças, como determina o Estatuto da Criança e do Adolescente, precisa ser uma prioridade concreta e financiada”, finaliza Mariana.

Este conteúdo foi originalmente publicado em “Colapso da proteção às crianças”, diz especialista sobre violência no site CNN Brasil.

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