
Em 1962, três prisioneiros escaparam da prisão de Alcatraz, nos Estados Unidos, até então considerada inexpugnável. Os prisioneiros nunca mais foram vistos e o caso permanece aberto até hoje. No dia 12 de junho de 1962, três homens escaparam da prisão de Alcatraz, nos Estados Unidos. Eles nunca mais foram vistos
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No dia 4 de maio, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciou na sua rede Truth Social a reabertura e ampliação de Alcatraz, a famosa prisão localizada em uma ilha próxima ao continente americano. Hoje, ela é uma atração turística na baía de São Francisco, no Estado da Califórnia.
Para Trump, Alcatraz se tornaria “um símbolo da lei, ordem e justiça”.
Em maio de 1964, o jornalista Michael Charlton fez “a viagem mais temida do mundo do crime” para o programa de TV Panorama, da BBC. Ele atravessou as águas agitadas da baía de São Francisco e visitou a mal-afamada prisão de Alcatraz.
Apelidada de “a Rocha”, a penitenciária federal americana recebeu alguns dos criminosos mais perigosos dos Estados Unidos. Ela era considerada uma fortaleza inexpugnável.
Mas, nas primeiras horas de 12 de junho de 1962, três prisioneiros conseguiram o que parecia impossível: eles escaparam de Alcatraz.
As origens do presídio
Antes considerada uma fortaleza inexpugnável, a prisão de Alcatraz foi construída em uma ilha na baía de São Francisco, no Estado americano da Califórnia
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Originalmente, a ilha abrigava um forte de defesa naval para proteger a entrada da baía.
Durante a Guerra Civil Americana (1861-1865), prisioneiros confederados foram levados para Alcatraz. O isolamento da ilha, os rochedos íngremes e as correntes frias e rápidas que a rodeavam favoreciam sua detenção.
Estas condições levaram o forte a ser reconstruído como uma prisão militar no início do século 20.
Nos anos 1930, os Estados Unidos tentavam combater o crescimento alarmante do crime organizado, que floresceu durante a Lei Seca (1920-1933).
Por isso, o Departamento de Justiça americano assumiu a prisão – e logo começaram a chegar a Alcatraz os mais temidos condenados do sistema prisional americano.
Seus prisioneiros mais famosos incluíram os notórios gângsteres Al Capone (1899-1947), Mickey Cohen (1913-1976) e George “Machine Gun” Kelly (1895-1954), além do assassino condenado Robert Stroud (1890-1963), que ficaria conhecido como o “Homem-Pássaro de Alcatraz”.
Eles eram “homens perigosos e problemáticos demais para serem mantidos em prisões comuns”, nas palavras de Charlton, na BBC.
Frank Lee Morris chegou à ilha quatro anos antes da visita do programa Panorama.
Morris havia ficado órfão aos 11 anos de idade e foi condenado pelo seu primeiro crime aos 13. Ele passou a maior parte da vida entrando e saindo de diversas penitenciárias.
Considerado muito inteligente, Morris adquiriu experiência no mundo do crime. Sua ficha policial variava de posse de drogas até assaltos à mão armada e, talvez o mais notável, fugas da prisão.
Ele foi transferido para Alcatraz em janeiro de 1960, depois de ter fugido da Penitenciária Estadual de Louisiana, nos Estados Unidos. E, assim que chegou à prisão de segurança máxima, começou a estudar uma forma de escapar.
No mesmo bloco do presídio, ele se associou aos irmãos John e Clarence Anglin, condenados por assalto a banco, além de Allen West (1929-1978), preso em Alcatraz desde 1957.
Todos eles se conheciam por terem passado outros períodos juntos na prisão. E, como suas celas eram vizinhas, eles conseguiam conversar entre si durante a noite.
Michael Charlton visitou Alcatraz um ano depois do seu fechamento. Ele conhecia a formidável reputação da prisão, conhecida pelos seus guardas implacáveis, condições rigorosas e pelos ventos marítimos que castigavam os prisioneiros.
“Um vento impiedoso que parece não ter fim, com uivos e ecos atravessando as barras”, descreveu ele. “Construídas sobre os corredores desconexos de um antigo forte… as fundações de Alcatraz, agora, estão se deteriorando e se desfazendo.”
Plano detalhado
Os fugitivos passaram meses perfurando um buraco nas suas celas até um corredor de serviço não vigiado pelos guardas da prisão
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Morris assumiu a liderança do grupo e os quatro prisioneiros começaram a elaborar um plano de fuga detalhado e audacioso.
Por vários meses, os três homens escavaram o concreto danificado pelo sal em volta da ventilação de ar embaixo das pias.
Usando colheres de metal retiradas do refeitório, uma furadeira feita com um motor de aspirador de pó e lâminas de serra descartadas, eles cavaram até um corredor de serviço que não era vigiado.
Para disfarçar o barulho da furadeira, Morris tocava acordeom durante o período do dia reservado à música para os prisioneiros.
Depois de escavarem um buraco com tamanho suficiente para que eles pudessem rastejar até o corredor, os prisioneiros subiram até o andar superior vazio do bloco e instalaram uma oficina secreta. Para esconder os buracos da parede das celas, eles criaram grades falsas de papel machê, feitas com revistas da biblioteca da prisão.
Na oficina, eles começaram a construir um barco de borracha improvisado de 1,8 m x 4,3 m e roupas salva-vidas feitas de mais de 50 capas de chuva roubadas.
Depois, eles transformaram uma concertina em ferramenta para inflar a embarcação e fizeram remos com pedaços de compensado.
Mas, enquanto trabalhavam, os prisioneiros precisavam ocultar sua ausência dos guardas que faziam rondas periódicas à noite. Para isso, eles esculpiram versões de papel machê de suas cabeças, com sabão, creme dental e papel higiênico.
Para que elas parecessem mais realistas, eles usaram cabelo de verdade do piso do barbeiro da prisão e as pintaram com cor de pele, usando material de arte roubado.
Os prisioneiros colocavam as cabeças no lugar nas suas camas, com feixes de roupas e toalhas embaixo dos cobertores, no formato dos seus corpos. Assim, parecia que eles estavam dormindo.
Enquanto eles trabalhavam no seu equipamento artesanal, eles também procuravam um caminho para a fuga. Usando a tubulação como degraus, os prisioneiros escalaram 9,1 metros até abrirem o ventilador no topo de uma coluna. Eles criaram um parafuso falso, feito de sabão, para mantê-lo no lugar.
Por fim, na noite de 11 de junho de 1962, os prisioneiros estavam prontos para colocar seu engenhoso plano em ação.
Deixando as cabeças falsas nas camas para enganar os guardas, Morris e os dois irmãos Anglin rastejaram através dos buracos nas paredes das celas.
A fuga de West não foi possível porque ele não conseguiu sair da sua cela a tempo. Por isso, os demais fugiram sem ele.
Eles escalaram até o teto da prisão e correram através dele, carregando seu barco artesanal, à vista da torre de guarda.
Os prisioneiros desceram por um cano de drenagem externo, cruzaram o jardim da prisão, escalaram duas cercas de arame farpado sucessivas de 3,7 metros de altura e desceram um aterro íngreme, até o porto no nordeste da ilha.
Ao chegarem à margem, eles inflaram o barco e desapareceram na noite.
O alarme soou apenas na manhã seguinte, quando foram descobertas as cabeças falsas.
A busca aos fugitivos
Alcatraz também servia de lar para as famílias dos guardas que trabalhavam na prisão.
O pai de Jolene Babyak trabalhava como guarda da prisão naquela época. Foi ele quem acionou o alarme.
“Quando acordei, a sirene ainda estava tocando”, relembrou ela em 2013, ao programa da BBC Witness History. “Era muito estridente, extremamente alto, era horrível, era muito assustador.”
“Fiquei em choque e meu primeiro pensamento foi que não poderia ser uma tentativa de fuga – e era, é claro.”
Alcatraz entrou imediatamente em lockdown. Começou então uma intensa busca em todas as construções, incluindo as acomodações dos oficiais da prisão.
Paralelamente, o pai de Babyak lançou uma caçada em massa. Centenas de policiais passaram dias examinando exaustivamente as áreas vizinhas da prisão.
No dia 14 de junho, a Guarda Costeira encontrou um dos remos dos prisioneiros. No mesmo dia, foi encontrado um pacote com pertences pessoais dos Anglins, vedado com borracha.
Sete dias depois, parte dos restos da embarcação chegou a um local perto da ponte Golden Gate, em São Francisco. E, no dia seguinte, foi descoberta uma das roupas salva-vidas artesanais.
Mas os três fugitivos nunca mais foram vistos.
Caso em aberto
Os prisioneiros podem ter escapado da prisão, mas as autoridades concluíram que eles certamente teriam perecido nas águas traiçoeiras, ao tentarem deixar a ilha.
Esta, com certeza, era a visão do guarda prisional Richard Willard, entrevistado pela BBC em 1964.
“Sim, somos poucos, mas eles não estão contando vantagem”, declarou ele. “Em outras palavras, todos eles consideravam que éramos poucos, mergulhados na burocracia.”
“De nosso conhecimento, não há ninguém andando pelas ruas hoje se gabando de ter escapado de Alcatraz”, prosseguiu Willard.
“Por que tenho tanta certeza? Você pode ouvir o vento, não é verdade? Você está vendo a água? Você acha que conseguiria atravessar?”
A prisão de Alcatraz foi fechada em 1963, um ano após a fuga dos prisioneiros.
O fechamento ocorreu, em parte, devido à deterioração da sua estrutura e aos seus custos de manutenção. Mas o regime severo da prisão era objeto de controvérsias há muito tempo.
Já em 1939, o então Procurador-Geral dos Estados Unidos, Frank Murphy (1890-1949), havia tentado fechar Alcatraz. Para ele, “a instituição como um todo conduz a uma psicologia que forma um comportamento sinistro e pernicioso entre os prisioneiros”.
Ao longo dos anos, prisioneiros incapazes de enfrentar as condições implacáveis de Alcatraz se mataram ou se mutilaram na prisão. E, nos anos 1960, os Estados Unidos começaram a buscar a reabilitação dos detentos, não apenas sua punição.
Com relação aos três fugitivos, seus corpos nunca foram encontrados na baía. Mas, em 1979, eles foram declarados legalmente mortos.
O FBI encerrou o caso e transferiu a responsabilidade para o U. S. Marshals, o Serviço de Delegados dos Estados Unidos. Mas as especulações sobre o destino dos prisioneiros fugitivos permanecem até hoje.
No mesmo ano em que eles foram declarados mortos, estreou o filme Alcatraz: Fuga Impossível, com Clint Eastwood interpretando Frank Morris. E, desde o momento da fuga, em 1962, existem relatos de supostos avistamentos e mensagens dos fugitivos.
Em 2018, a polícia de São Francisco revelou ter recebido uma carta misteriosa cinco anos antes, de alguém afirmando ser John Anglin. Segundo a carta, “escapei de Alcatraz em junho de 1962. Sim, todos nós conseguimos naquela noite, mas foi por pouco!”
A carta dizia que os homens viveram em segredo desde então. Frank Morris teria morrido em outubro de 2005 e Clarence Anglin, em 2008. O autor da carta dizia que, agora, ele gostaria de negociar sua rendição em troca de tratamento de câncer.
O FBI analisou a carta, mas não conseguiu verificar sua autenticidade. E o caso ainda está em aberto no U. S. Marshals Service.
Em 2022, o órgão atualizou as imagens da possível aparência atual dos três prisioneiros desaparecidos de Alcatraz. Ele pede qualquer informação sobre os fugitivos, na esperança de poder, finalmente, esclarecer o mistério.
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