Em entrevista à CNN, a mãe e irmã de Vitória Chaves da Silva, jovem que passou por três transplantes de coração e foi exposta nas redes sociais, falou sobre descoberta do vídeo em que Gabrielli Farias de Souza e Thaís Caldeiras Soares Foffano, estudantes de medicina, zombavam da filha.
“Foram 26 anos de luta, diminuídos em um vídeo de 2 minutos, de forma totalmente equivocada”, afirma Claudia Chaves.
A mulher diz que um dia pegou o aparelho da filha e encontrou uma mensagem de um amigo sobre uma postagem no TikTok que falava sobre o caso dela. A mãe conta que quando assistiu o vídeo pela primeira vez ficou supressa com a forma que Gabrielli e Thais falavam da menina.
“No começo eu fiquei admirada de ver que o caso da minha filha estava sendo exposto de forma tão clara. Só que aí, no final, veio a tristeza, o desespero. Eu comecei a chorar”, comentou Claudia.
“Nós vimos isso como algo muito ofensivo. As falas delas abriram espaço para que outras pessoas falassem mal da minha irmã. Além disso, ao dizerem que ela não tomava as medicações, permitiram que as pessoas atacassem minha irmã. Como se, enquanto criança e depois de adulta, ela não tivesse recebido os cuidados necessários, o que não era verdade”, disse a irmã. Giovanna Chaves.
O vídeo publicado foi gravado nas dependências do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, onde a paciente Vitória Chaves da Silva, de 26 anos, estava internada. A paciente morreu no dia 28 de fevereiro, dias após a gravação do vídeo.
O caso de Vitória
Claudia contou que estava grávida de 6 meses quando fez um ultrassom que mostrava o coração de Vitória dilatado. No momento em que nasceu, a jovem foi diagnosticada com anomalia de Ebstein, uma doença rara. Segundo ela, os médicos disseram que ela viveria no máximo 15 dias. Com 2 anos, a menina fez uma cirurgia e chegou ao peso que os médicos queriam, mas o procedimento não resolveu.
“Nós tivemos que ir para São Paulo. Lá, recebemos a notícia que ela precisaria de um transplante. Ela ficou um e meio na fila, fez o transplante, ficou bem e se desenvolveu. Após 11 anos, o primeiro transplante começou a dar problema.”
A mãe da menina conta que ela entrou de novo na fila, que ficou por dez meses. “E de novo, o problema foi o coração, mas não por falta de medicação, e sim pelo agravamento causado pelos próprios remédios. Porque o transplante tem um tempo de sobrevida. Ele não é pra sempre, só prolonga a vida do paciente”, disse Claudia.
Giovanna relatou que cerca de cinco anos depois do primeiro transplante, Vitória já tinha metade da função cardíaca comprometida. “Mesmo assim, ela viveu com esse coração por mais quatro anos. Então, se ela não tivesse tomado as medicações, não teria vivido todo esse tempo.”
Investigação
A mãe diz que o primeiro passo da investigação foi procurar a delegacia mais próxima de onde a família mora para realizar a denúncia. Segundo ela, o caso foi registrado como ocorrência civil, mas não como crime. A mulher procurou o Conselho Regional de Medicina (CRM).
O órgão alegou que pelo fato de serem estudantes, as envolvidas não tinham registro no CRM e que, por isso, a denúncia não poderia ser feita.
Para Giovanna, que o que as estudantes fizeram foi “antiético”. Ela considera que as jovens expuseram o caso e afirmaram coisas inverídicas. Além disso, deram detalhes muito específicos sobre um caso raro.
“Nos comentários, elas dizem que tinham autorização [para falar sobre o caso], mas não tinham. Dizem que fizeram um relato de caso escrito. Queremos esse relato para comprovar, mas as instituições dizem que isso não está nas mãos delas e o Incor também não responde se está com eles ou não.
Medidas cabíveis
A mãe de Vitória diz que as decisões cabem ao juiz responsável pelo caso e que aceitará o que ele determinar. Ela afirma que o maior desejo da família é que o caso sirva de exemplo, não só para estudantes, mas sim para todas as instituições de saúde.
“Eu queria muito que as pessoas, antes de julgar, pesquisassem o que é um transplante, quanto tempo ele dura, quais doenças os remédios causam. E que parassem de dizer que eu quero aparecer. Eu não quero. Eu só quero viver o luto da minha filha e não está sendo fácil. Aí eu pergunto: vocês gostariam que fosse com um filho ou parente de vocês? Se coloquem no lugar do outro. É só isso que eu quero: justiça!. E que o Conselho de Ética fique mais em cima dos hospitais, das dificuldades, e mostre que tem que haver ética, sigilo. As coisas não podem ser assim. Meu objetivo maior é esse. Não é só por mim, é por todos”, finalizou Claudia.
O que diz os envolvidos
Em nota enviada à CNN, a Faculdade de Medina da USP afirmou que Gabrielli Farias de Souza e Thaís Caldeiras Soares Foffano fazem parte de outras instituições e que estavam no hospital em função de um curso de extensão de cerca de um mês. Além disso, esclareceu que elas não possuem qualquer vínculo acadêmico com a faculdade.
“A FMUSP repudia com veemência qualquer forma de desrespeito a pacientes e reafirma o compromisso inegociável com a ética, a dignidade humana e os valores que norteiam a boa prática médica. A instituição reforça ainda a missão de formar profissionais comprometidos com a excelência e com o cuidado humano, valores que são inegociáveis em nossa Instituição”, complementou a nota.
* Sob supervisão
Este conteúdo foi originalmente publicado em “Desespero”, diz mãe de menina transplantada que foi zombada em hospital no site CNN Brasil.