Crise humanitária em Gaza se agrava após um mês de bloqueio israelense

Um mês após Israel cortar a ajuda humanitária da Faixa de Gaza, agências de auxílio afirmam que a situação humanitária se deteriorou perigosamente, com a situação de dois milhões de civis agravada pelas intensivas operações militares israelenses.

As Nações Unidas e várias ONGs, assim como civis em Gaza que conversaram com a CNN, relatam que a fome está se espalhando, há menos acesso à água potável e pulgas infestam campos improvisados de deslocados.

Os problemas que afligem a população do território nos últimos 18 meses foram acentuados pela nova ofensiva lançada pelo exército israelense em março, que incluiu várias ordens de retirada.

O governo israelense interrompeu o fornecimento de alimentos e outras ajudas humanitárias para Gaza antes da ofensiva, numa tentativa de pressionar o Hamas a libertar mais reféns e impor novas condições para a extensão do cessar-fogo.

Israel também afirmou que o Hamas intercepta e desvia carregamentos de ajuda humanitária para o território, uma acusação confirmada pelos Estados Unidos em maio passado.

Mais de 280 mil pessoas foram deslocadas nas últimas duas semanas, e dois terços do território de Gaza são agora áreas proibidas, segundo o Escritório das Nações Unidas para a Coordenação de Assuntos Humanitários (OCHA).


Palestinos fogem de Rafah em meio a operação militar de Israel • 7/6/2024 REUTERS/Hatem Khaled

Assem Al-Nabeeh, porta-voz do município de Gaza, disse à CNN que após várias ordens recentes de saída “as pessoas estão literalmente sendo deslocadas para todos os lugares, em estradas principais, parques públicos, perto de lixões, em praças e até em edifícios que estão à beira do colapso.”

“Mesmo antes das últimas ordens de deslocamento, apenas 40% da cidade tinha acesso à água”, continuou Al-Nabeeh. Ele estimou que 175 mil toneladas de lixo se acumularam pela cidade.

O alto funcionário do OCHA para os territórios palestinos, Jonathan Whittall, afirmou no início desta semana que uma “guerra sem limites” estava em curso em Gaza.

Fome e desnutrição são ameaças constantes

Em um relatório divulgado na sexta-feira (4), o Escritório informou: “Gaza enfrenta risco renovado de fome e desnutrição, já que o bloqueio total de carga, agora entrando no segundo mês, praticamente interrompe toda a distribuição de farinha e fecha todas as padarias subsidiadas.”

O Programa Mundial de Alimentos (WFP) informou na quinta-feira (3) que todas as 25 padarias subsidiadas em Gaza fecharam por falta de gás de cozinha e farinha.

Acrescentando que mais de um milhão de pessoas ficaram sem cestas básicas em março e, embora o fornecimento de refeições quentes continue, os “suprimentos atuais durarão duas semanas no máximo.”

A agência israelense responsável pela coordenação das entregas de ajuda em Gaza alega que deve haver “um mecanismo estruturado de monitoramento e entrada de ajuda” para evitar que o Hamas apreenda suprimentos humanitários e garantir que as operações das organizações permaneçam “neutras e imparciais.”


Padaria parcialmente destruída em Deir al Balah, na Faixa de Gaza • Ashraf Amra/Anadolu via Getty Images

A agência Coordenadora de Atividades Governamentais nos Territórios de Israel (COGAT na sigla em inglês) declarou que um novo mecanismo que está preparando “apoiará organizações de ajuda, aumentará a supervisão e responsabilidade, e garantirá que a assistência chegue à população civil necessitada, em vez de ser desviada e roubada pelo Hamas.”

O mecanismo foi apresentado a organizações internacionais de ajuda, segundo um funcionário da COGAT, mas o uso está condicionado a um acordo de cessar-fogo ou uma mudança na diretiva do governo.

O WFP afirma que cerca de 89 mil toneladas de alimentos aguardam do lado de fora de Gaza, enquanto a escassez de alimentos dentro está elevando os preços dramaticamente.

Um saco de farinha de trigo custa 450% mais do que há algumas semanas.

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Falta de acesso à água e saneamento

Enquanto isso, o OCHA alega que o acesso à água permanece “severamente limitado” — com dois terços das famílias de Gaza incapazes de acessar seis litros de água potável por dia.

Após uma melhora na produção e fornecimento de água durante o recente cessar-fogo, as agências agora lutam para reparar e manter a infraestrutura.

Isso também está afetando o saneamento em áreas cada vez mais lotadas com pessoas deslocadas.

“As condições de saneamento em toda a Faixa de Gaza, permanecem alarmantes”, relatou o Escritório, com locais improvisados de deslocamento na costa infestados de pulgas e ácaros.

A administração Biden pressionou repetidamente o governo israelense para permitir mais ajuda humanitária em Gaza, incluindo pausar um carregamento de bombas devido à preocupação com a população civil no território costeiro.

Mas essa pressão praticamente desapareceu sob a administração Trump.


Palestinos coletam água em meio à escassez enquanto o conflito entre Israel e o Hamas continua, em Khan Younis, no sul da Faixa de Gaza. • CNN Newsource

Gavin Kelleher, do Conselho Norueguês para Refugiados, declarou no final de março que “mais de um milhão de pessoas continuam precisando desesperadamente de barracas em Gaza”, mas sua organização “não tem quase nada para distribuir, apesar de ainda ver essas transferências forçadas massivas acontecendo diariamente.”

“Muitas pessoas, sem abrigo alternativo, estão ficando em edifícios estruturalmente precários e danificados, onde continuam sendo registrados incidentes de prédios desabando sobre homens, mulheres e crianças”, acrescentou Kelleher.

Nas últimas semanas, uma média de 100 crianças foram mortas ou mutiladas diariamente em Gaza, segundo o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF).

A diretora-executiva da agência, Catherine Russell, afirmou que as crianças da região “foram novamente mergulhadas em um ciclo de violência mortal e privação”.

A UNICEF explica que ela e outras agências “não conseguiram fornecer roupas e outros itens essenciais nem mesmo para as crianças deslocadas mais vulneráveis, que só têm as roupas que estão vestindo”.


Crianças palestinas desalojadas em carroça durante retirada de regiões do norte de Gaza após ordem de retirada da região

Hospitais em Gaza superlotados após retomada dos ataques israelenses

Com o aumento das baixas desde o fim do cessar-fogo, a Organização Mundial da Saúde relata que os hospitais de Gaza estão sobrecarregados com pacientes.

Segundo a organização, o Hospital Al-Shifa, no norte do território, está atendendo 400 pessoas diariamente, quase o triplo da média de 140 antes da retomada das hostilidades em 18 de março.

Dr. Fadel Naeem, diretor do Hospital Batista Árabe Al-Ahli na Cidade de Gaza, compartilhou com a CNN que sua unidade estava sobrecarregada com o número de corpos e feridos chegando.

Somente em 3 de abril, ele disse que 128 pessoas feridas haviam chegado “e o hospital simplesmente não tem capacidade para lidar com esse volume devido ao bloqueio contínuo ao setor de saúde”.

Naeem contou que o hospital foi forçado a “priorizar”, realizando cirurgias apenas para aqueles com maior probabilidade de sobrevivência.

“Tragicamente, enquanto esperavam por atendimento, alguns dos feridos morreram devido à falta de recursos, salas de cirurgia e equipe médica”, acrescentou o diretor.

Philippe Lazzarini, chefe da Agência de Obras e Socorro das Nações Unidas, que lidera os esforços da ONU nos territórios palestinos, disse que “As pessoas estão passando fome, o caos e os saques retornaram… As pessoas estão exaustas por continuarem trancadas em um pedaço minúsculo de terra”.

Este conteúdo foi originalmente publicado em Crise humanitária em Gaza se agrava após um mês de bloqueio israelense no site CNN Brasil.

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